Minha análise do documentário "Estamira", de Marcos Prado
Por Fernanda Santiago Valente
Estamira é um filme de Marcos Prado, que iniciou a idéia do trabalho através de fotografias. Antes de ser diretor, era apenas fotógrafo. Estamira foi o primeiro filme que dirigiu sozinho. Com todo material de fotografia que tinha do lixão pensava em publicar um livro, mas mudou de idéia quando conheceu Estamira, uma pessoa com problemas de alucinações mentais que já trabalhava há 20 anos como catadora de lixos.
O documentário Estamira conta toda a trajetória de vida da personagem, que mesmo aparentando ser louca traz uma mensagem lúdica em todo o filme. O diretor mostra o lado humano da personagem, se preocupa com os detalhes e a realidade de vida é mostrada sem um roteiro definido ou decorado. Tudo acontece através dos depoimentos e pensamentos de Estamira. Percebe-se que diretor utiliza apenas uma filmadora e máquina fotográfica. Foram quatro anos para o documentário ser realizado. Um ano foi utilizado apenas para montar o filme. E com isso, obteve material não apenas para um filme, mas para dois.
O primeiro filme conta a história de vida de Estamira, envolvendo seus familiares e seu trabalho no lixão. Já o segundo, é "Estamira, para todos e para ninguém" que mostra a sua vida no lixão com seus amigos. Um trabalho, onde o catador ganha-se de R$10,00 a R$ 35,00 por dia e que muitas famílias dependem do lixão para sobreviver.
O telespectador fica hipnotizado desde as primeiras imagens do filme, que tem a trilha sonora e efeito de som em harmonia com tudo o que acontece. O diretor conseguiu captar o lado psicológico da personagem e através disso, fez uma ironia sobre tudo o que vai para o lixo.
A família de Estamira é religiosa, mas ela perdeu a fé em fé em Deus e nem gosta de que a palavra Deus ou Jesus sejam citadas. Isso provoca grande desespero, raiva e angústia na personagem durante todo o filme. Ela teve uma vida conturbada desde a infância, seu próprio avô a levou para se prostituir num bordel. Casou-se aos 17 anos, não deu certo. Foi morar com outra pessoa que a traia e maltratava e a expulsou de casa. Teve três filhos, duas moças e um rapaz. Foi estuprada. A partir desse episódio é que começaram suas alucinações e consequentemente iniciou sua vida no lixão. O filme é muito rico na fotografia e detalhes, dando uma linguagem poética.
A equipe, mesmo sem muita tecnologia conseguiu captar a realidade: aquilo que ninguém quer ver, aquilo que todos ignoram, pessoas que comem nossos lixos, pessoas que fazem do lixo algo útil. É a sujeira que ninguém quer ver e o cheiro que ninguém quer sentir.
O diretor, contando com uma equipe de produção pequena teve muita pesquisa e aprofundamento. O diretor realmente se envolveu com a personagem principal, não só mostrando como é a vida dela, mas participando de tudo. As gravações foram feitas durante noites, durante dias, na casa da personagem, ouvindo seus familiares e amigos, utilizando de muitas imagens enquanto contavam os depoimentos.
No lixão teve o detalhe e cuidado de mostrar outros personagens, além dos rios de xorumes, cães e catadores comendo restos de lixo.
O trabalho de montagem seguiu a regra cronológica, cada palavra de Estamira incomoda quando casa-se com toda miséria e podridão que é apresentada no lixão. Algumas frases de Estamira surgem efeito de incomodo: "Vivemos de restos e descuidos", "Não tenho dó de ninguém", "As doutrinas trocadas ridicularizam os homens", "Vocês não aprendem na escola, vocês copiam".
Neste filme, o diretor mostrou que dá para conseguir um excelente roteiro através de palavras e pensamentos de um personagem, mesmo não sendo alguém "lúdico". Deu também para perceber que toda a iluminação do filme foi através de luz natural. Em alguns momentos para captar as lembranças da personagem trabalhou com recurso em preto e branco.
Este documentário recebeu 33 prêmios.
Direção:
Produção:
Fotografia:
Montagem:
Som direto:
Trilha Sonora:
Mixagem:
Trilha sonora adicional:
Produção Executiva:
Assistente de direção:
Assistente de edição:
Um comentário:
Tem o lado legal das frases e respostas inusitadas, mas também tem um quase bullying quando ela usa vocabulário ofensivo contra um menor, que pergunta porque ela não gosta que falem de Deus.
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